É necessário que os trabalhadores controlem para que o corte não seja ainda maior que o disposto na lei Pág. 1
Eugénio Rosa – Economista – Mais estudos disponíveis em www.eugeniorosa.com
CORTES ABUSIVOS NOS VENCIMENTOS DOS TRABALHADORES DA
ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA: o que dispõe a Lei 55-A/2010 e o que os serviços
estão a fazer
Os trabalhadores da Administração da Administração Pública sofreram em Janeiro o primeiro corte
nos seus vencimentos. Vários trabalhadores enviaram-nos alguns dados do seu “Talão de
vencimento” perguntando se o corte feito estava de acordo com o disposto na lei. E constatamos
que em vários casos, a nosso ver, os serviços estavam a fazer cortes superiores aos que
resultariam da aplicação da lei, como estes fossem insuficientes. E isto é mais grave quando
pensamos que os serviços estão a utilizar um software fornecido pelo próprio Ministério da
Administração Pública e das Finanças. Por isso, para não receberam um vencimento ainda mais
reduzido, é necessário que os trabalhadores que sofreram cortes nos seus salários controlem
esses cortes, e se concluírem que eles foram superiores aos que deviam resultar da aplicação da
lei, aconselhamos a reclamarem. Neste estudo vamos, por um lado, mostrar por que razão
achamos que a própria lei está a ser aplicada incorrectamente, pelos serviços, em vários casos e,
por outro lado, fornecer aos trabalhadores informação para que eles possam defender-se
controlando a aplicação da lei no seu caso concreto pois, como é evidente, é manifestamente
impossível responder individualmente a todos que tenham dúvidas.
O QUE DISPÕE A LEI 55-A/2010 SOBRE O CORTE DE SALÁRIOS E O
QUE OS SERVIÇOS ESTÃO A FAZER
Os cortes nos vencimentos dos trabalhadores da Administração Pública encontram-se regulados
no artº 19 da Lei 55-A/2010, que se transcreve na integra em anexo, para que qualquer
trabalhador interessado, tenha acesso fácil a ele e se possam defender. Seguidamente
apresentamos a interpretação que fazemos do disposto no artº 19º da Lei 55-A/2010.
Em primeiro lugar interessa definir o que é a remuneração total ilíquida mensal que, segundo a lei,
está sujeita à redução (corte). E essa definição consta do nº 4 do artº 19º da lei que se transcreve
em anexo. Segundo a alínea a) do nº4 (ver anexo), a remuneração total ilíquida inclui “todas as
prestações pecuniárias, designadamente, remuneração base, subsídios, suplementos
remuneratórios, incluindo emolumentos, gratificações, subvenções, senhas de presença, abonos,
despesas de representação e trabalho suplementar, extraordinário ou em dias de descanso”; mas
não inclui, de acordo com a alínea b) do artº 4º (ver anexo) ”os montantes abonados a título de
subsidio de refeição, ajudas de custo, subsidio de transporte ou reembolso de despesas
efectuadas nos termos da lei e os montantes pecuniários que tenham natureza de prestação
social”. Se o trabalhador recebe suplementos remuneratórios ou prestações pecuniárias fixadas
em percentagem da remuneração base o valor do suplemento ou da prestação para determinar a
remuneração total ilíquida é calculado com base no valor da remuneração base antes do corte (nº
7 do artº 19º). E é o valor assim obtido que deve ser considerado para se saber se o trabalhador
está sujeito ou não ao corte de vencimento e, em caso afirmativo, qual é a percentagem de
redução (corte).
No cálculo da remuneração total ilíquida sujeita à redução (corte) existe uma questão muito
importante que os serviços estão a resolver incorrectamente que resulta, a nosso ver, de uma
aplicação incorrecta da lei, o que está a determinar cortes abusivos e superiores aos que já
resultam da lei, como estes fossem insuficientes.
E essa questão é a seguinte. Muitos trabalhadores receberam em Janeiro de 2011, por atraso no
processamento da responsabilidade dos serviços, remunerações por trabalho realizado, não em
2011, mas sim em 2010. Pudemos ver vários “Talões de vencimento” de Janeiro de 2011 que
incluíam a remuneração de trabalho extraordinário realizado em Novembro de 2010 e mesmo em
Outubro de 2010. E os serviços consideraram essa remuneração como fosse de trabalho prestado
depois da entrada em vigor da lei 55-A/2010, ou seja, prestado em 2011, embora o não fosse, e
sujeitaram essa parte da remuneração também a um corte que, segundo a interpretação que
fazemos da Lei, é incorrecto lesando ainda mais esses trabalhadores. E isto porque aplicaram
retroactivamente uma lei que, a nosso ver, só se aplica à remuneração por trabalho prestado em
2011. Repetindo, isto corresponde a uma aplicação retroactiva da lei determinando, a meu ver, um
corte abusivo no vencimento do trabalhador, contra o qual ele deve imediatamente reclamar.
A própria lei fiscal, que é muito rigorosa, não admite tais interpretações. Nos casos em que o
trabalhador recebe no ano seguinte um rendimento referente ao ano anterior, a lei manda aplicar a
esse rendimento do ano anterior a lei do ano a que esse rendimento diz respeito, ou seja, a lei em
vigor no ano anterior, tendo de ser feito um recalculo do IRS pago no ano anterior (artº 74º do
Código do IRS- Rendimentos produzidos em anos anteriores). Por analogia os serviços deviam
fazer o mesmo em relação à Lei 55-A/2010, e as remunerações de trabalho prestado em 2010,
embora recebidas em 2011, não deviam entrar para o cálculo da remuneração ilíquida total
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