ENTREVISTA
o casal Sérgio Alves e Flávia Leal: "Há um ano e meio, tudo era diferente.
Tinha muito dinheiro do Irã, Rússia e China rodando em Dubai"
A bolha de Dubai, que explodiu na quinta-feira com o pedido de moratória no valor de US$ 59 bilhões feito pela Dubai World, braço de investimentos do governo, pode ser pior do que parece. E, assim como a bolha imobiliária americana, que deflagrou a crise mundial, a economia de Dubai já vinha dando sinais de fragilidade há bastante tempo. Havia algo de errado no conto das mil e uma noites.
“Há um ano e meio, as coisas eram diferentes. Havia muito dinheiro circulando em Dubai, legal e ilegal, vindo do Irã, da Rússia e da China. Com a crise, o dinheiro voltou para seus países de origem. Agora, está tudo parado. Não se vende nem se compra nenhum imóvel. A tendência é piorar”, diz o veterinário Sérgio Henrique Alves da Silva, que passou um ano e oito meses em Dubai, com a mulher, Flávia Leal, como executivo da PetLand, empresa local.
Sérgio e Flávia voltaram para o Brasil há 10 dias – e por um bom motivo: pela legislação de Dubai, quando uma empresa pede concordata, seus executivos ficam retidos durante dois anos no país. Já se antecipando a uma crise na PetLand, eles voltaram mais cedo para casa. “E todas as empresas estão passando por dificuldades. O caixa não fecha no fim do dia”, conta. É por isso que tem se tornado comum, em Dubai, encontrar carros de luxo abandonados nas ruas ou em estacionamentos. Pertenciam a executivos que também deixaram o país. “Cerca de 2 mil carros são abandonados no aeroporto ou nos shoppings de Dubai todos os meses”, diz Sérgio.
O governo de Dubai se endividou para fazer obras faraônicas, como a maior torre do mundo, uma nova cidade de US$ 90 bilhões e até uma Disneylândia de US$ 64 bilhões, além de ilhas com formato do mundo (o investidor que comprou a ilha Irlanda já se suicidou), e a crise o pegou de jeito.. O dinheiro fácil do Irã, Rússia e China bateu asas. Dubai está, agora, nas mãos dos demais emirados árabes, que devem ajudar seus xeques delirantes. Na visão de analistas, a crise poderá ser resolvida rapidamente caso os países árabes do Golfo ajam em tempo para evitar que a crise se torne uma dor de cabeça.
“Abu Dhabi, por exemplo, já vinha injetando dinheiro em Dubai e não deverá ficar parado”, aposta o economista da Universidade Libanesa, Fares Ishtay. Para ele, os outros vizinhos árabes, como Arábia Saudita, Kuwait e Qatar, também deverão agir logo para socorrer Dubai e acalmar os mercados. “Eles devem ajudar Dubai porque têm investimentos e são credores do emirado e também porque uma eventual queda na demanda por petróleo, causada por mais uma nova crise, prejudicaria suas exportações”, disse. A dívida total de Dubai está estimada em US$ 80 bilhões em 2008, entre eles US$ 70 bilhões correspondentes a companhias públicas.
Na verdade, o problema de Dubai não é Dubai, e sim os credores da Dubai World, que poderão enfrentar problemas de caixa. É isso que está deixando os mercados nervosos. Estrelas e gente famosa já estão aparecendo na lista dos que perderam dinheiro com o calote. Segundo o diário Times of India, o jogador de futebol David Beckham, hoje no Los Angeles Galaxy, e o ator Brad Pitt estariam entre as celebridades com investimentos ligados ao setor imobiliário de Dubai. A crise de Dubai é exatamente isto: um alerta de que a crise mundial ainda não passou.
O ator Brad Pitt foi um dos afetados
Os setores mais vulneráveis à bolha árabe são o bancário e o industrial. Entre as empresas com acionistas no emirado estão as montadoras Volkswagen e Porsche, na Alemanha; os bancos Barclays e HSBC, na Grã-Bretanha; e UBS e Credit Suisse, na Suíça. Outro problema é que Dubai tem grandes dívidas com os principais bancos europeus. Segundo o Credit Suisse, esse montante giraria em torno de US$ 40 bilhões.
O banco britânico HSBC é o estabelecimento estrangeiro mais exposto à dívida de Dubai, com 11,3 bilhões de euros de empréstimos no fim de 2008. O Credit Suisse calculou em 13 bilhões de euros a exposição dos bancos europeus à dívida de Dubai.
O segundo banco mais presente nos Emirados é o Standard Chartered, outro banco britânico, cujos empréstimos concedidos chegam a 5,1 bilhões de euros, no fim de 2008. Em seguida, vem o britânico Barclays, com 2,3 bilhões de euros em empréstimos. O primeiro banco francês atingido é o BNP Paribas, cujos empréstimos nos Emirados Árabes Unidos chegaram a 1,1 bilhão de euros no fim de 2008. É aí que reside o perigo, de que o calote de Dubai gere outros calotes mundo afora.
Para acalmar investidores brasileiros e estrangeiros, o presidente do Banco Central (BC), Henrique Meirelles, afirmou ontem que não há bancos brasileiros expostos ao Dubai World. De acordo com ele, o problema não deve gerar grandes repercussões na economia mundial, mas ressalta que “a recuperação está ocorrendo, mas ainda está sujeita a incertezas”, o que deveria conter a euforia dos mercados. Os três maiores bancos brasileiros – Banco do Brasil, Itaú Unibanco e Bradesco – soltaram notas garantindo não terem exposição à Dubai World. O ministro da Fazenda, Guido Mantega, também garantiu que a crise não chegará ao Brasil. “Acho que não vai pegar. Isso (medo de calote) mexeu um pouco com os mercados, mas acho que aqui não vai ter maiores consequências”, disse.
De fato, ontem as bolsas tiveram um dia mais tranquilo. A Europa fechou em alta. Londres subiu 0,99% e Frankfurt, 1,27%. Já as bolsas americanas fecharam em baixa. O Dow Jones teve recuo de 1,48%. No Brasil, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) subiu 1,04% e o dólar caiu 0,4%, a R$ 1,74.
Comentário do Jornal dos Amigos
Esse é o castigo imposto por utilizarem mão-de-obra praticamente escrava com acomodações desumanas nas construções em Dubai. O sonho vira pesadelo.
www.jornaldosamigos.com.br
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