sexta-feira, 8 de abril de 2011

DESPACHO DUM JUIZ BRASILEIRO

DESPACHO POUCO COMUM


A Escola Nacional de Magistratura incluiu em seu banco de sentenças, o
despacho pouco comum do juiz Rafael Gonçalves de Paula, da 3ª Vara
Criminal da Comarca de Palmas, em Tocantins. A entidade considerou de
bom senso a decisão de seu associado, mandando soltar Saul Rodrigues
Rocha e Hagamenon Rodrigues Rocha, detidos sob acusação de furtarem
duas melancias:




DESPACHO JUDICIAL...
DECISÃO PROFERIDA PELO JUIZ RAFAEL GONÇALVES DE PAULA NOS AUTOS DO PROC
Nº 124/03 - 3ª Vara Criminal da Comarca de Palmas/TO:
DECISÃO
Trata-se de auto de prisão em flagrante de Saul Rodrigues Rocha e
Hagamenon Rodrigues Rocha, que foram detidos em virtude do suposto furto
de duas (2) melancias. Instado a se manifestar, o Sr. Promotor de
Justiça opinou pela manutenção dos indiciados na prisão.
Para conceder a liberdade aos indiciados, eu poderia invocar inúmeros
fundamentos: os ensinamentos de Jesus Cristo, Buda e Ghandi, o Direito
Natural, o princípio da insignificância ou bagatela, o princípio da
intervenção mínima, os princípios do chamado Direito alternativo, o
furto famélico, a injustiça da prisão de um lavrador e de um auxiliar de
serviços gerais em contraposição à liberdade dos engravatados e dos
políticos do mensalão deste governo, que sonegam milhões dos cofres
públicos, o risco de se colocar os indiciados na Universidade do Crime
(o sistema penitenciário nacional)....
Poderia sustentar que duas melancias não enriquecem nem empobrecem
ninguém. Poderia aproveitar para fazer um discurso contra a situação
econômica brasileira, que mantém 95% da população sobrevivendo com o
mínimo necessário apesar da promessa deste presidente que muito fala,
nada sabe e pouco faz.
Poderia brandir minha ira contra os neo-liberais, o consenso de
Washington, a cartilha demagógica da esquerda, a utopia do socialismo, a
colonização européia....
Poderia dizer que George Bush joga bilhões de dólares em bombas na
cabeça dos iraquianos, enquanto bilhões de seres humanos passam fome
pela Terra - e aí, cadê a Justiça nesse mundo?
Poderia mesmo admitir minha mediocridade por não saber argumentar diante
de tamanha obviedade.
Tantas são as possibilidades que ousarei agir em total desprezo às
normas técnicas: não vou apontar nenhum desses fundamentos como razão
de decidir.
Simplesmente mandarei soltar os indiciados. Quem quiser que escolha o
motivo.
Expeçam-se os alvarás.
Intimem-se.
Rafael Gonçalves de Paula
Juiz de Direito

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