terça-feira, 9 de agosto de 2011

ISTO NÃO O PREOCUPA'

Mais coisa, menos coisa, é assim sem tirar nem pôr!
Explicar o BCE na esplanada do café...





A Primavera esmerou-se. Um sol agradável acariciava-nos na esplanada do café à beira da minha porta. A chegada do Senhor Antunes, o mais popular dos meus vizinhos, deu ensejo a uma lição sobre Europa e finanças a nós todos que disto pouco ou nada percebemos.



- Oh Sô Antunes explique lá isso do Banco Central Europeu, aqui à rapaziada do Café.

- Então vá, vá lá, Só por esta vez. O BCE é o banco central dos Estados da UE que pertencem à zona euro, como é o caso de Portugal.

- E donde veio o dinheiro do BCE?

- O capital social, o dinheiro do BCE, é dinheiro de nós todos, cidadãos da UE, na proporção da riqueza de cada país. Assim, à Alemanha correspondeu 20% do total. Os 17 países da UE que aderiram ao euro entraram no conjunto com 70% do capital social e os restantes 10 dos 27 Estados da UE contribuiram com 30%.

- E é muito, esse dinheiro?

- O capital social era 5,8 mil milhões de euros mas no fim do ano passado foi decidido fazer o 1º aumento de capital desde que há cerca de 12 anos o BCE foi criado, em três fases. No fim de 2010, no fim de 2011 e no fim de 2012 até elevar a 10,6 mil milhões o capital do banco.

- Então, se o BCE é o banco destes Estados pode emprestar dinheiro a Portugal, não? Como qualquer banco pode emprestar dinheiro a um ou outro dos seus accionistas.

- Não, não pode.

- ???

- Porquê? Porque... porque, bem... são as regras.

- Então, a quem pode o BCE emprestar dinheiro?

- A outros bancos, já se vê, a bancos alemães, bancos franceses ou portugueses.

- Ah percebo, então Portugal, ou a Alemanha, quando precisa de dinheiro emprestado não vai ao BCE, vai aos outros bancos que por sua vez vão ao BCE e tal.

- Pois.

- Mas para quê complicar? Não era melhor Portugal ou a Grécia ou a Alemanha irem directamente ao BCE?

- Não. Sim. Quer dizer... em certo sentido... mas assim os banqueiros não ganhavam nada nesse negócio!

- ??!!..

- Sim, os bancos precisam de ganhar alguma coisinha. O BCE de Maio a Dezembro de 2010 emprestou cerca de 72 mil milhões de euros a países do euro, a chamada dívida soberana, através de um conjunto de bancos XPTO, a 1% e esse conjunto de bancos XPTO emprestaram ao Estado português e a outros Estados a 6 ou 7%.

- Mas isso assim é um "negócio da China"! Só para irem a Bruxelas buscar o dinheiro!

- Neste exemplo, ganharam uns 3 ou 4 mil milhões de euros. E não têm de se deslocar a Bruxelas, nem precisam de levantar o cu da cadeira. E qual Bruxelas qual carapuça. A sede do BCE é na Alemanha, em Frankfurt, onde é que havia de ser?

- Mas, então, isso é um verdadeiro roubo... com esse dinheiro escusava-se até de cortar nas pensões, no subsídio de desemprego ou de nos tirarem o 13º mês, que já dizem que vão tirar...

- Mas, oh seu Zé, você tem de perceber que os bancos têm de ganhar bem, senão como é que podiam pagar os dividendos aos accionistas e aqueles ordenados aos administradores que são gente muito especializada.

- Mas quem é que manda no BCE e permite um escândalo destes?

- Mandam os governos dos países da zona euro. A Alemanha em primeiro lugar que é o país mais rico, a França, Portugal e os outros países.

- Deixa ver se percebo. Então, os Governos dão o nosso dinheiro ao BCE para eles emprestarem aos bancos a 1% para depois estes emprestarem a 5 e a 7% aos Governos donos do BCE?

- Não é bem assim. Como a Alemanha é rica e pode pagar bem as dívidas, os bancos levam só uns 3%. A nós ou à Grécia ou à Irlanda que estamos de corda na garganta e a quem é mais arriscado emprestar é que levam juros a 6%, a 7 ou mais.

- Nós somos os donos do dinheiro e nós não podemos pedir ao nosso banco...

- Nós, nós, qual nós? O país, Portugal ou a Alemanha, é composto por gentinha vulgar e por pessoas importantes que dão emprego e tal. Você quer comparar um borra-botas qualquer que ganha 400 ou 600 euros por mês ou com um calaceiro que anda para aí desempregado com um grande accionista que recebe 5 ou 10 milhões de dividendos por ano, ou com um administrador duma grande empresa ou de um banco que ganha, com os prémios a que tem direito, uns 50, 100, ou 200 mil euros por mês. Não se pode comparar.

- Mas, e os nossos Governos aceitam uma coisa dessas?

- Os nossos Governos, os nossos Governos... mas o que é que os governos podem fazer? Por um lado, são, na maior parte, amigos dos banqueiros ou estão à espera dos seus favores, de um empregozito razoável quando lhes faltarem os votos. Em resumo, não podem fazer nada, senão quem é que os apoiava?

- Mas oh que porra de gaita! Então eles não estão lá eleitos por nós?

- Em certo sentido, sim, é claro, mas depois... quem tem a massa é que manda. Não viu isto da maior crise mundial de há um século para cá? Essa coisa a que chamam sistema financeiro que transformou o mundo da finança num casino mundial como os casinos nunca tinham visto nem suspeitavam e que ia levando os EUA e a Europa à beira da ruína? É claro, essas pessoas importantes levaram o dinheiro para casa e deixaram a gentinha que tinha metido o dinheiro nos bancos e nos fundos a ver navios. Os governos, então, nos EUA e cá na Europa, para evitar a ruína dos bancos tiveram que repor o dinheiro.

- E onde o foram buscar?

- Onde havia de ser!? Aos impostos, aos ordenados, às pensões. Donde é que havia de vir o dinheiro do Estado?...

- Mas meteram os responsáveis na cadeia?

- Na cadeia? Que disparate. Então, se eles é que fizeram a coisa, engenharias financeiras sofisticadíssimas, só eles é que sabem aplicar o remédio, só eles é que podem arrumar a casa. É claro que alguns mais comprometidos, como Raymond McDaniel, que era o presidente da Moody's, uma dessas agências de rating que classificaram a credibilidade de Portugal para pagar a dívida como lixo e atiraram com o país ao tapete, foram passados à reforma. O Sr. McDaniel é uma pessoa importante, levou uma indemnização de 10 milhões de dólares a que tinha direito.

- Oh Sor Antunes, então como é? Comemos e calamos?

- Isso já não é comigo, eu só estou a explicar...

 DEFINITIVAMENTE: PARECE QUE É NECESSÁRIO FISCALIZAR A ACTIVIDADE DOS GOVERNOS, E QUE O VOTO, ENQUANTO CHEQUE EM BRANCO, NÃO GARANTE A DEMOCRACIA E A JUSTIÇA SOCIAL.

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